segunda-feira, 18 de julho de 2011

O presente mais lindo

Poema Barroco

Cedo, ela lhe contou sobre o amor.
Mas, como se aprende a amar, sem saber o que é saudade?
Os dois são amigos que se vêem rápido, feito sol e lua.
Um, claro e forte; outra, linda e triste.
Saudade é querer que o tempo faça diferente.
Amor é o Tempo querendo da gente o mesmo,também.
Tempo não precisa de ninguém.
Saudade precisa de um.
Amor, de dois.
Vinte dias de luz, menos dias de sombra.
Amor e saudade, dia e noite.
Um só chega quando o outro sai...
Ouro que vira prata, e quando o tempo vira nada
Os dois se fundem em um terceiro:
O querer (esse sim o mais valioso) eterno.

domingo, 17 de julho de 2011

Revisão

Todo texto precisa ser revisado, antes de ser publicado. Até mesmo aqueles que são cuidadosa e demoradamente escritos, rascunho após rascunho, por toda a vida. Em determinado momento, o autor (perdoe-me, Umberto Eco, não precisa ser nenhum modelo para fazer pensar nisso) apercebe-se dos seus erros e se dedica, enfim, a reescrever as partes falhas. Percebe ele, então, muitos, infinitos falhanços. E percebe, triste, que as falhas dos outros que tiveram início em si são profundamente dotadas do seu próprio arrependimento... Mas que as falhas inerentes dos outros, aquelas nas quais ele não pode tocar, mexer, apagar, essas são irreparáveis.

Só há duas possibilidades, nesse caso: 1) Aprender a com elas conviver ou 2) Arrancar a página do caderno, forçosamente, e substituir o vácuo da narrativa, mais à frente, por outros enredos. Afinal de contas, nada (nem ninguém, especialmente) não é digno de substituição.

Mas o sujeito-autor que se quer de papel, pobre destino, é também uma falha em pessoa, cujo primeiro dos erros é o medo de errar. E nisso ele considera, cogita, perde noites de sono. E disfarça, e sorri, e desabafa com os mais chegados. E qual é sua decisão? Escrever para organizar. Para pensar e refletir. Para, enfim, acalmar.

Talvez ele escreva pelo medo da solidão (e as palavras são companheiras perfeitas. Uma vez com elas, sempre ao lado delas, basta solicitá-las). Amigas presentes, convocadas através do mais profundo silêncio, vêm devagar e entram na cabeça do autor e fluem por suas rápidas mãos. E, como jorros de sangue (ou lágrimas que teimam em não se desprender dos olhos reais), vão, mimeticamente, reproduzindo os movimentos que o coração gostaria de fazer, mas não pode.

O conjunto universo que envolve o autor, seu eu-lírico, quem sabe? Ou um exoesqueleto de palavras e sentimentos? Enfim... ISTO sugere, humildemente: "Deixe passar. Não se desfaça de nenhuma personagem. Mostre a si mesmo que é capaz de continuar escrevendo, a história está ficando boa, vá em frente."

E ele, reticente, aceita a sugestão.

Não há o que fazer. Impossível: voltar no tempo, modificar personalidades adultas, desfazer amores, olhar-se sem um espelho.

Deixa, enfim, estar. Convoca a banda que gosta: "deixa ser/ como será/ tudo posto em seu lugar.../ numa moldura clara e simples/ sou aquilo que se vê".

Mas ele não se vê e, por isso, vai se deixando refletir através dos olhos dos outros. E quem será ele, ao fim e ao cabo, se não tiver espelhos carnais por quem venha a se mirar, a se escrever e a produzir?

Deixa estar.