quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Retina

Manhã de terça-feira, caminhando pela rua, vi a moça sair do prédio. Seus cabelos molhados, seu terninho preto, seu ar cansado e seus tantos quilos a mais deixariam passar a atenção do transeunte. Seu ar comum facilmente a camuflaria no meio da rua vazia. O sol forte, refletido na Baía, chamava mais a atenção para a beleza do dia do que para a beleza que sua leve corcundinha escondia. Lado direito da rua, adiante.
No caminho oposto, confesso, ele chamou atenção. Alto, cabelo rente, a roupa social figurava mais uniforme que elegante. Seu olhar fixo suspirava preocupação. Ou nada mesmo, não sei precisar. Vinha do lado direito.
Ela ia... ...Ele vinha.
Ela foi. Ele também.
Eu passava, eles passaram antes de mim.
E foi então que eu vi.
Os olhos dele acompanharam a beleza escondida por baixo dos cabelos molhados no ombro. Seus olhos, apontando para baixo, não suspeitaram daquilo que os meus foram testemunhas.
Depois da rápida mirada, do olhar que escapava um pequeno e suave sorriso, ele retomou sua caminhada. E foi. E ela, partindo de seu olhar baixo, melancólico, curvado, olhou para trás e deixou escapar um pensamento infeliz, sozinho. Pensou na solidão, no almoço, talvez. Na meia furada, na janela esquecida aberta. Ou no transeunte tão bonito, tão bonito pra ela. O seu mesmo que lhe tinha mirado, admirado.

***

Nossos olhos caminham na fugacidade, se perdem em um mar de visões. É bom parar a mirada de vez em quando, registrando na retina as passagens da vida real. E depois, com os olhos do papel (ou do écran, tanto faz), fazer História com essas moventes paisagens.